sexta-feira, 26 de março de 2010

Tecnologia Aerospacial:Uma indústria em cima da mesa_Brasil deve pensar em uma nova Política para o setor

Postado por Espaço Democrático de Debates às 09:29 Marcadores: Aerospacial, Nanotecnologia, Nanotubos Carbono, Política Desenvolvimento Tecnológico 0 comentários
Luiz Define de Castro
Concluiu o seu doutoramento em Materials Science, na Universidade de Bath, na Grã-Bretanha, em 1991. Atualmente, ele está a fazer consultoria, para o Centro Tecnológico do Exército (CTEx), em 2 de projectos de investigação com a Petrobras e FINEP, que visam desenvolver petróleo arremessos de carbono, fibra de carbono e materiais avançados. Ele é o autor de 1 patente internacional, 17 artigos em periódicos e conferências, e, também, outros 19 técnicos produções. Entre 1982 e 1988 ele foi cobrado em 4 de projectos de investigação e chefiou o carbono / grafite grupo de CTEx. Ele trabalha no Materials Science and Materials área Química com ênfase em altura, arremesso petróleo, coque, fibra de carbono e de grafite





Engenheiro fala sobre atraso do Brasil em relação a materiais de carbono e nanotecnologia

A nanotecnologia já supera a redução de tamanho de objetos, especialmente para a medicina e o uso de materiais, e avança no manuseio dos átomos, individualmente. O tema é mais acessível aos leigos, quando relacionado, por exemplo, com uma lagartixa ou a bola de futebol, como se lerá aqui. "Tudo que era micro virou nano até para se conseguir financiamento dos órgãos de fomento do governo", afirma o presidente da Associação Brasileira de Carbono (ABCarb), o engenheiro químico Luiz Depine de Castro, consultor do Centro Tecnológico do Exército, em Guaratiba, Rio de Janeiro. Em entrevista exclusiva publicada ontem pelo Jornal do Brasil, Depine lamentou o pouco conhecimento do país em tecnologia do carbono, que tem impacto sobre múltiplas atividades, como a siderurgia e a indústria automobilística. Nesta edição, ele trata dos nanomateriais de carbono, a exemplo de nanofibras, nanoesferas e nanotubos.
"A lagartixa virou um exemplo universal de como a natureza muitas vezes nos mostra algo que vamos levar tempo para entender. Se os pelos existentes na pata da lagartixa não fossem extremamente finos, reduzidíssimos, ela nunca conseguiria andar de cabeça para baixo. Funcionam como velcro", comenta.
Segundo Depine, a nanotecnologia, a partir de arranjo de átomos, será uma verdadeira revolução na forma de produção como conhecemos hoje. "Primeiro porque miniaturizará as fábricas, segundo porque modificará completamente a demanda por mão-de-obra e terceiro porque eliminará, praticamente, a ocorrência de defeitos".

O senhor relaciona o desenvolvimento da tecnologia de carbono com o de nanotecnologia. Por quê?
Nanotecnologia está na moda. Tudo que era micro virou nano até para se conseguir financiamento dos órgãos de fomento. Eu diria que a nanotecnologia, que penetra em todos os segmentos do conhecimento, tem dois ramos principais: a medicina e a área de materiais. Os nanomateriais de carbono, tais como nanofibras, nanoesferas e nanotubos de carbono têm aplicação em ambos os segmentos e de uma forma extremamente forte, principalmente na área de materiais.

Sintetize, por favor, a redução de materiais que simboliza a nanotecnologia.
A humanidade sempre se importou com o tamanho das coisas até para compatibilizá-las com a nossa capacidade de transportar. Não existe melhor exemplo para isso do que o computador. Na terminologia nanotecnológica isso seria chamado de uma redução "top-down", ou seja, de cima para baixo. Começa-se com um material de grande tamanho e consegue-se progressivamente reduzir o tamanho de seus componentes. Um exemplo clássico são os chips dos computadores.

Como está o desenvolvimento da nanotecnologia atualmente?
Hoje, quando se fala em nanotecnologia se fala, na realidade, de algo mais ousado que é o chamado bottom-up, ou seja, de baixo para cima. Não se trata mais de reduzir o tamanho de algum objeto já existente para torná-lo menor, mas sim construir os objetos a partir do manuseio dos átomos, individualmente. Essa nova visão começou com Richard Feynman, professor do Instituto de Tecnologia da Califórnia, em 1959, quando ele mostrou, em palestra, as potencialidades da miniaturização. A palestra de Feynman ficou esquecida até 1986 quando Eric Drexler publicou o livro Engines of creation popularizando o que se conhece hoje como nanotecnologia. Em 1989, Don Eigler, pesquisador do laboratório da IBM, mostrou concretamente que a teoria do bottom-up era algo concreto.

Por que a lagartixa é um símbolo da natureza importante para a nanotecnologia?
A lagartixa virou um exemplo universal de como a natureza muitas vezes nos mostra algo que vamos levar tempo para entender. Se os pelos existentes na pata da lagartixa não fossem extremamente finos, reduzidíssimos, ela nunca conseguiria andar de cabeça para baixo. Funcionam como velcro. À medida que reduzimos a dimensão dos objetos nós deixamos, proporcionalmente, mais átomos na superfície dos mesmos e é isso que conta, porque são os átomos da superfície que são importantes para que as reações e os fenômenos ocorram com maior facilidade.

Qual é o exemplo relacionado à bola de futebol?
A bola de futebol é um outro exemplo semelhante ao da lagartixa, quando verificamos algo novo que a natureza já nos mostrava há muito tempo. Isso está relacionado aos fulerenos, que são um dos nanomateriais de carbono. Tornou-se conhecimento popular que o arquiteto Richard Buckminster Fuller, projetista do domo do pavilhão americano na Expo 67, em Montreal, não conseguia produzir uma forma esférica perfeita, arranjando os hexágonos da estrutura e que, após uma noite de sono, ele teve a ideia de inserir um pentágono e cercá-los por hexágonos obtendo o que procurava. Em 1985, quando uma nova forma alotrópica do carbono foi descoberta, Harry Kroto e Richard Smalley verificaram que ela exibia estrutura idêntica à imaginada por Fuller, que ficou popularmente conhecida como fulereno. Os fabricantes de bola de futebol copiaram a ideia de Fuller para produzir uma bola perfeitamente esférica.

O arranjo dos átomos, na miniaturização, cria enormes possibilidades. Quais?
É claro que estamos falando de algo que há 50 anos era ficção científica e que demonstrou ser viável a partir do experimento de Don Eigler nos laboratórios da IBM. A tecnologia bottom-up para produzir materiais, a partir do arranjo dos átomos, será uma verdadeira revolução na forma de produção como conhecemos hoje. Primeiro porque miniaturizará as fábricas, segundo porque modificará completamente a demanda por mão-de-obra, e terceiro porque eliminará, praticamente, a ocorrência de defeitos. As pessoas que conseguem visualizar o futuro imaginam a possibilidade de se colocar fábricas completas em cima de uma mesa. Obviamente a mão-de-obra necessária para operar essas fábricas será, em termos numéricos, insignificante em relação ao que conhecemos atualmente e sua qualificação não será nada comparada ao que temos hoje.

Quais são os nanomateriais de carbono conhecidos?
Os nanomateriais de carbono conhecidos são as nanofibras, as nanoesferas, os fulerenos e os nanotubos. Certamente os mais divulgados são os nanotubos, mas todos têm grande aplicação.

E os nanotubos?
Os nanotubos atraíram enorme atenção, desde a sua descoberta em 1991, por duas razões básicas: a sua alta resistência mecânica e a sua versatilidade na área eletrônica. A resistência à tração de um nanotubo de carbono, teoricamente, chega a ser 30 vezes mais forte que a fibra de carbono e aproximadamente 150 vezes mais forte que o aço. É hoje o material mais forte que o homem é capaz de produzir. Na área eletrônica ele é o material ideal porque pode ser produzido para ter um comportamento metálico ou semicondutor.

Que desafios enfrentam a tecnologia de carbono?
A tecnologia do carbono, exceto a dos nanomateriais, já está bastante consolidada no mundo. É claro que, ainda assim, se busca sempre melhorar o que já se conhece, reduzir o custo de fabricação e obter materiais inovadores. Foi assim na década de 60 com a fibra de carbono e, na década de 80, com a espuma grafítica. Quando se fala de Brasil, os maiores desafios são a quase completa ignorância sobre o assunto, o desconhecimento quase completo de sua potencialidade, a carência de especialistas e pesquisadores no setor e a convicção das empresas de que vão conseguir exportar e vender seus produtos interna e externamente ignorando a existência desses materiais.


E os desafios da nanotecnologia, dos nanomateriais?
Quanto aos nanomateriais de carbono, por ser algo extremamente recente, existem grandes desafios tecnológicos a serem vencidos. Um deles diz respeito ao controle da sua produção para obter exatamente o material desejado e não uma mistura. Os nanotubos, por exemplo, podem ter comportamento metálico ou de semicondutor, portanto é necessário identificar como se pode controlar a fabricação para se ter um ou outro. Muitos outros desafios tecnológicos estão e estarão presentes, por muito tempo, mas eu diria que o custo de fabricação é sempre a chave para a popularização de tudo que se inova.

Quais as aplicações de nanomateriais em desenvolvimento?
São incontáveis. Nanoesferas, por exemplo, podem ser utilizadas como aditivos em óleos lubrificantes. Nanofibras podem ser utilizadas como reforço em materiais compósitos ou, popularmente, composições de materiais. Nanotubos de carbono podem ser utilizados em baterias recarregáveis, principalmente utilizando lítio, em supercapacitores, em circuitos eletrônicos, e na geração de imagens tanto em raios-X como em displays, além do emprego óbvio reforçando materiais compósitos. É claro que, se conseguirmos explorar na prática toda a potencialidade dos nanotubos de carbono, será possível, como já publicou a revista Nature (vol. 423, pág. 703), se produzir algo tão leve como uma camiseta à prova de balas que, além disso, seria capaz de carregar microsensores para medir a temperatura do corpo, os batimentos cardíacos, etc.
Há empresas explorando comercialmente essas áreas? Onde?
Sim, no Japão, na Europa e nos Estados Unidos.

O carbono e a nanotecnologia, juntos, podem conduzir à existência de elevadores espaciais?
Esse é um sonho da Nasa nos Estados Unidos (sigla em inglês de National Aeronautics and Space Administration ou Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço). Hoje é uma ficção científica, mas que ela gostaria que se tornasse realidade. Como esse material é extremamente forte, teoricamente seria possível se ter um elevador espacial cujos cabos fossem feitos de nanotubos de carbono.

Esses materiais de carbono têm lugar definitivo no cenário tecnológico?
Todos os materiais de carbono estão progressivamente ocupando espaços dos materiais tradicionais, seja sob a forma de compósitos de fibra de carbono, de espuma grafítica ou de nanomateriais de carbono. A grande restrição ao seu uso generalizado ainda é o custo. Entretanto, já se consegue comprar na internet varetas para pipa e aeromodelos, além de vasos sanitários feitos integralmente em fibra de carbono. Em pouco tempo, muito pouco tempo mesmo, quem não estiver produzindo, por exemplo, carros de linha com várias partes em fibra de carbono dificilmente conseguirá se manter no mercado. Se a crise não abrandar as restrições impostas pela Comunidade Europeia, isso já começará a acontecer em 2010. Até a indústria da construção civil no Brasil já sentiu essa necessidade e, até o momento, tem sido a mais agressiva para utilizar esse tipo de material.

Qual a posição do Brasil no desenvolvimento de materiais na atualidade?
Sobre o desenvolvimento de materiais de carbono, a posição do Brasil é praticamente nula. Com exceção do núcleo do Centro Tecnológico do Exército e de alguns poucos pesquisadores em universidades brasileiras, ninguém mais desenvolve esses materiais. Quanto aos materiais, como um todo, o Brasil ainda carece de tecnologia para a produção de materiais especiais.

A Associação Brasileira de Carbono (ABCarb) tem um projeto para o desenvolvimento do setor?
A ABCarb, criada oficialmente em 2007, resultou do anseio dos poucos pesquisadores brasileiros interessados na área do carbono e que há muito tempo decidiram juntar esforços para tentar melhorar a situação do país nesse setor. Não conta com nenhum apoio governamental ainda, tampouco com o apoio de nenhuma empresa privada, embora estejamos fazendo força para que isso aconteça. Ela tem pouco mais de um ano e espera-se que, com a divulgação de sua existência, as empresas privadas compreendam o esforço que estamos fazendo e a necessidade de apoiá-la.

Como a ABCarb pode ser apoiada?
A ABCarb vem fazendo o que é possível para uma entidade iniciante. Mantém, por exemplo, excelente relacionamento com suas similares ao redor do mundo, como os grupos britânico e francês de carbono. Entre 11 e 13 de junho de deste ano está promovendo, junto com o Grupo Francês de Carbono, o I Encontro Franco-Brasileiro de Carbono na cidade de Bordeaux. Ela auxilia seus associados na solução de problemas, indicando locais para execução de ensaios tecnológicos e possíveis consultores. Bienalmente, ela promove o congresso brasileiro de carbono que esse ano tem sua realização ameaçada pela retração dos possíveis patrocinadores, em consequência da crise econômica internacional. É intenção da ABCarb lançar revista científico-tecnológica na área de materiais de carbono, mas a entidade ainda busca patrocinadores para isso. Toda empresa que quiser apoiar a ABCarb encontrará no seu site (www.abcarb.org.br) a forma de fazê-lo e os benefícios correspondentes.

Quanto o Brasil deveria investir nesta área? Qual é o papel da iniciativa privada?
O problema maior não é o quanto o Brasil deveria investir na área de nanotecnologia, nem mesmo o quanto ele deveria investir em ciência e tecnologia, mas sim como ele deveria fazer isso. Entretanto, eu posso dar alguns números dos investimentos feitos na área de nanotecnologia só para efeito de comparação. Somente em nanotecnologia,em 2003, o Japão investiu algo ao redor de US$ 1 bilhão; os EUA, US$ 774 milhões, a Coreia, US$ 757 milhões; e o Brasil, em 2004, US$ 97 milhões. Eu acho que essa pergunta necessita de uma resposta mais completa. Até por volta de 1920, a tecnologia que se desenvolvia no mundo tinha base exclusivamente empírica. Isso significa dizer que a academia e a iniciativa privada se desconheciam completamente e não necessitavam uma da outra. A partir dessa época, as empresas verificaram que se tornava cada vez mais difícil inovar e começaram a buscar suporte na ciência. Surgiu, então, o que se convencionou chamar de tecnologia de base científica e que foi a responsável pela explosão tecnológica que o mundo conheceu.

Qual a diferença do nosso modelo científico-tecnológico?
Pode-se dizer que o Brasil "descobriu" a ciência e a tecnologia na década de 70, quando começou a formar, em quantidades significativas, seus doutores nas universidades européias e americanas. Nessa ocasião, o país decidiu adotar um modelo de desenvolvimento científico-tecnológico semelhante ao dos Estados Unidos, sem levar muito em consideração as peculiaridades do país. Nos EUA, as universidades se preocupam em fazer ciência e alguma tecnologia, com o apoio governamental, porque as empresas privadas fazem todo o restante do desenvolvimento tecnológico. Aqui as coisas são bem diferentes. Raríssimas empresas privadas têm um laboratório de pesquisa e desenvolvimento, contando com pós-graduados (mestres e doutores) em seus quadros. Com isso, o modelo brasileiro ficou destorcido porque só se preocupou com a ciência. O Estado não atuou para desenvolver ou induzir o desenvolvimento tecnológico. Publicaram-se e se publicam centenas de artigos em revistas científicas internacionais, mas quase não se depositam patentes ou se gera inovação. Se tivéssemos nos aproximado um pouco mais dos modelos europeu ou asiático, talvez a situação fosse diferente.
Há possibilidade de uma mudança positiva?
O Brasil já entendeu o problema e as coisas parecem que estão tendendo a mudar. A criação, pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep, uma empresa pública), dos chamados Centros Tecnológicos (CTs), CT Petro, CT Verde e Amarelo, e outros, é um exemplo disso. Nesse caso, o governo financia parcialmente o desenvolvimento tecnológico em uma instituição de pesquisa, desde que ela esteja associada a uma empresa privada. Infelizmente essa iniciativa ainda é muito tímida. O problema se agrava quando o próprio governo envia sinais ambíguos através de seus órgãos oficiais. Os órgãos avaliadores das instituições de pesquisa e dos pesquisadores não valorizam a geração de patentes e a inovação da mesma forma que a publicação de artigos científicos. Dessa forma os pesquisadores, na sua grande maioria, se desinteressam das patentes por que elas contarão muito pouco para sua ascensão profissional. Na verdade, as patentes se tornam um estorvo altamente inconveniente para os pesquisadores.

Por quê?
Vamos dar um exemplo concreto: para um aluno de doutorado defender tese ele tem, na quase totalidade das universidades brasileiras, de publicar um artigo científico, enquanto o registro de uma patente não tem qualquer valor nesse sentido. É absolutamente impossível no tempo reservado ao doutorado se produzir trabalho de qualidade, registrar uma patente, que exige sigilo por um longo tempo, e ainda publicar artigo científico. Dessa forma, os pesquisadores evitam o quanto podem se envolver com patentes e inovação. Quem perde é o Brasil, que continua gerando majoritariamente papel e exportando produtos primários. Eu me doutorei na Europa, mas não poderia fazê-lo no Brasil. A minha tese foi defendida logo após o registro da patente que ela gerou (tecnologia para inibir a oxidação de carbono em altas temperaturas) e os artigos científicos começaram a ser publicados somente um ano após a obtenção do título. Passados mais de 20 anos, o que foi feito na Europa ainda não se faz no Brasil.

Estamos investindo bem?
Isso tudo é para dizer que, antes de dimensionar o quanto seria necessário investir no desenvolvimento de materiais de carbono e mais ainda na área de tecnologia, precisamos pensar seriamente na forma como estamos investindo, e se ela vai nos levar a atingir os objetivos de um país que quer ser uma potência mundial. Em 1998, eu publiquei um artigo em revista nacional intitulado A tecnologia, a educação e a balança comercial – reduzir, cortar e chorar porque nessa época nossa balança comercial era altamente deficitária e eu comentava que, se não agregássemos valor às nossas exportações iríamos acabar cortando na carne e chorando. Veio a bolha de desenvolvimento quatro anos depois e o resultado sobre a balança comercial todo mundo conhece. A bolha estourou nessa crise mundial e a nossa balança comercial voltou à realidade. Eu prefiro encerrar essa entrevista com a mesma frase que usei, na época, para encerrar o artigo que mencionei: "A quem é incapaz de gerar a globalização só permitirá reduzir, cortar e chorar!".

Qual a importância estratégica do carbono para o Brasil?
O elemento carbono tem características únicas dentro da famosa tabela periódica, que todos nós
conhecemos no estudo da Química, tanto no segundo grau como na universidade. Dada à sua
possibilidade de se hibridizar de diferentes formas, o carbono pode produzir materiais com características completamente diferentes e até mesmo antagônicas, tais como materiais macios, duros, porosos, impermeáveis, entre outros. Com tais possibilidades, o leque de materiais especiais que se pode produzir a partir do elemento carbono permeia quase todos os campos e áreas de aplicação do conhecimento humano. Ele não é negligenciado no mundo e não pode ser no Brasil.
O que o País desenvolve em fibra de carbono?
Primeiramente deve-se ressaltar que existem mais de 100 tipos diferentes de fibra de carbono e
para cada aplicação deve-se selecionar a mais conveniente, de acordo com as suas propriedades.
Normalmente as fibras de carbono são classificadas pelas suas propriedades termomecânicas e pelos seus materiais precursores. Existem fibras de carbono de altíssima resistência à tração, com uma resistência específica (em peso) maior que 15 a 20 vezes a do aço, e existem fibras com altíssima condutividade térmica e elétrica que superam o alumínio e o cobre. Obviamente existem fibras de carbono com valores intermediários em ambas as propriedades mencionadas e que são utilizadas por indústrias não tão exigentes. De qualquer forma, a pior fibra de carbono tem uma resistência específica à tração (por peso), pelo menos 5 vezes superior à do aço. Como a fibra de carbono é muito leve, muito forte e alta condutora térmica e elétrica, pode-se fazer quase tudo com ela, como cadeiras, mesas, aviões, carros, cabos condutores de alta tensão. No Brasil, vem tomando força a cada dia o emprego das fibras de carbono na construção civil, não só nos reforços estruturais (até condomínios já estão reforçando piscinas em fibra de carbono) como na substituição do próprio concreto armado.

O que o País já tem ?
O Brasil faz muito pouco. Não existe uma política de desenvolvimento dessa tecnologia no País.
O único centro de pesquisa de materiais de carbono está localizado no Centro Tecnológico do Exército, em Guaratiba, e conta hoje com aproximadamente 40 pessoas, entre pesquisadores e técnicos, trabalhando em tempo integral para desenvolver essa tecnologia. Criado na década de 80 como grupo de pesquisa em carbono-grafite, foi durante décadas um esforço individual do Exército. Atualmente contac om o apoio financeiro da Petrobras em vários projetos, tendo se tornado Núcleo de Competência para o Desenvolvimento da Tecnologia do Carbono (NCDTC). Além do núcleo do Centro Tecnológico do Exército, alguns poucos pesquisadores isolados trabalham em universidades brasileiras tentando desenvolver materiais específicos de carbono, mas são realmente muito poucos.

Quem detém a tecnologia de fibra de carbono?
Temos que separar as fibras de carbono, como mencionei anteriormente, pelos precursores, a
matéria-prima que lhes deu origem. Os dois precursores mais utilizados atualmente são a poliacrilonitrila e o piche. A poliacrilonitrila é um polímero bastante conhecido e utilizado na indústria têxtil. Quando melhorada em suas características, a poliacrilonitrila pode ser usada para fabricar fibra de carbono. Essa tecnologia não é hoje desenvolvida em nenhum lugar no Brasil. A tecnologia da fibra de carbono de poliacrilonitrila de altíssima qualidade é dominada pela Ásia, particularmente pelo Japão, que supre 88% das necessidades mundiais. Os outros 12% são supridos por empresas norte-americanas. A Alemanha domina o mercado da fibra de carbono de poliacrilonitrila para outros tipos de aplicação.

E no caso de piche?
A fibra de carbono de piche utiliza como matérias-primas o alcatrão da hulha, oriundo das
siderúrgicas, e o chamado "fundo do barril" de petróleo, aquele resíduo que sobra das refinarias e que é normalmente misturado ao óleo combustível para ser queimado em caldeiras ou fornos. Essa tecnologia, portanto, além de agregar um enorme valor a esses resíduos, contribui para evitar a poluição do meio ambiente. Essa fibra de carbono é que está sendo desenvolvida no Centro Tecnológico do Exército, com o apoio da Petrobras. A tecnologia dessa fibra de carbono é dominada pelo Japão e pelos Estados Unidos. O primeiro supre aproximadamente 90% da demanda mundial enquanto o segundo atende 10% do mercado. Um quilo de fibra de carbono de piche, de propriedades médias, custaria algo em torno de US$ 40, aproximadamente o mesmo que um barril de petróleo de 200 quilos. Existem fibras de carbono de piche, de altíssima qualidade, que podem chegar a custar US$ 1.800 por quilo.

Quais são a oferta e a demanda de fibra de carbono no mercado mundial? Para que setores industriais?
A oferta mundial de fibra de carbono estava (antes da crise) ao redor de 35 mil a 40 mil toneladas por ano e a demanda estava ligeiramente acima da oferta, razão pela qual os preços subiram tanto nos últimos anos. A previsão para 2010 era de que a demanda chegasse próximo de 50 mil toneladas por ano. A demanda de fibra de carbono cobre praticamente todos os setores industriais e é comum a separação em três grandes segmentos: indústria aeronáutica, indústria de material esportivo e outras áreas industriais. Da indústria aeronáutica e da indústria de material esportivo, era esperada uma estabilização na quantidade demandada ao redor de 10 mil toneladas por ano e 8 mil toneladas por ano, respectivamente, até pelo menos 2012.

O que está ocorrendo na indústria automobilística?
O grande incremento na demanda era esperado (antes da crise) em outras indústrias, particularmente na automobilística. A Comunidade Europeia, por exemplo, estabeleceu um peso limite de 800 quilos para os carros, o que deveria ser atingido até 2010. Com esse limite há necessidade do emprego maciço de fibra de carbono, não só na carroceria, como no eixo cardã e em várias outras partes dos carros.
No Brasil, é a indústria da construção civil que está demandando mais fortemente o uso de
fibra de carbono principalmente para reforços estruturais. Existem empreiteiras, inclusive, executando reforços estruturais sem custo somente para se credenciarem na aplicação desse material. É quase um pagar para aprender.

O Brasil também é dependente de importação da grafite? Qual é o valordo mercado mundial dos produtos da grafite?
O Brasil é totalmente dependente da importação de grafites especiais. Em território brasileiro só
se produz eletrodos de grafite que são fabricados por uma multinacional americana localizada na Bahia.É uma grafite de tecnologia menos sofisticada e que atende a indústria siderúrgica. É difícil mensurar o mercado mundial, hoje em dia, principalmente nesse momento de tanta instabilidade, mas o mercado das grafites especiais (aquelas de tecnologia mais sofisticada) deve estar ao redor US$ 2 bilhões por ano.

A indústria do aço brasileira depende de tecnologia do exterior parafuncionar? Por quê?
Sim, para produzir aço é necessário fundir o ferro-gusa em um forno a arco elétrico e adicionar
os materiais que produzirão as diferentes ligas de aço. Esse forno trabalha com os eletrodos de grafite que mencionei anteriormente e que no Brasil são produzidos por uma multinacional. Não se tem a tecnologia de fabricação de grafite no País. A única tentativa feita nesse sentido foi um esforço pioneiro do Centro Tecnológico Exército, já mencionado. Existem somente quatro empresas no mundo produzindo eletrodos de grafite e qualquer um que queira produzir aço em grande quantidade, com boa pureza e relativo baixo custo, tem que se submeter ao preço e às condições que elas impõem aos eletrodos. Se a multinacional que opera hoje no Brasil decidir suspender suas operações por razões diversas, como a atual crise, o País terá que conseguir importar esse material de um dos três
outros fabricantes mundiais - freqüentemente acusados de formarem um cartel -, arcando no preço final do aço com o custo do transporte e da incerteza da importação dos eletrodos de grafite.

Qual a relação da produção do carbono com a de energia?
O carbono se liga à área energética por meio de vários materiais para diferentes aplicações, que
vão dos supercapacitores até os reatores nucleares, passando pelas baterias de celulares e notebooks, cabos de alta tensão, polímeros condutores células a combustível, entre outros. O carbono, principalmente sob a forma de grafite, fibras de carbono e nanotubos de carbono, é material imprescindível à área de energia.

Qual a participação das fontes energéticas primárias no consumo mundial?
Em 2006, o petróleo tinha aproximadamente 35,8% de participação no consumo mundial de
energia, o gás tinha 22,8%, carvão, 27,3%, hidroeletricidade, 6,18%, nuclear, 5,8% e outras 1,6%.
Convém ressaltar que a atualização das curvas de Marchetti mostrou que a energia nuclear e o carvão estão com participação acima do previsto pelo autor em 1984, compensando a participação inferior à prevista do gás natural. Portanto, deve-se ter cuidado quando se afirma que o mundo abandonou a energia nuclear. Essa afirmação não se sustenta pelos dados concretos. Na realidade, o carvão e a energia nuclear estão com uma participação acima do que era previsto em 1984.

Por que o Brasil, com tantos recursos hídricos, deve continuar investindo em energia nuclear?
Em minha opinião, energia e tecnologia, além da educação, obviamente, são itens básicos para
qualquer país ascender ou se manter entre os mais ricos e desenvolvidos do mundo. Dessa forma, o País não pode prescindir de qualquer fonte de geração de energia, principalmente a nuclear, que é uma das mais eficientes do mundo. Isso sem considerar que o Brasil detém uma das maiores jazidas de urânio no mundo. Seria, portanto, uma insensatez desprezar tal fonte de energia. É preciso ficar claro que não existe fonte de energia perfeita. Todas as fontes de energia, de alguma forma, interferem no meio ambiente, até mesmo as aparentemente inofensivas. Podemos citar como exemplo a energia eólica cujas pás dos moinhos matam milhares de insetos por dia, tanto é que elas têm que ser limpas constantemente para manter a sua eficiência.

Gazeta Mercantil - O potencial hídrico brasileiro tem limitação em médio prazo?
O potencial hídrico brasileiro é uma dádiva, mas não é infinito, e tem limitações em médio prazo,
sim. Em dezembro de 2008 foi publicado o livro "A energia, a política internacional e o Brasil: conflitos e propostas no século XXI", organizado por José Alexandre Hage, no qual eu tive a oportunidade de escrever um capítulo sobre energia. Lá está mostrado que todo o potencial hidroelétrico brasileiro, inventariado até o momento, se esgotaria em 2026 ou em 2036 se o PIB brasileiro crescesse 5,5% e 3,9% ao ano, respectivamente. O País teria, portanto, somente 28 anos, no máximo, para conseguir uma outra fonte de energia primária confiável e perene, nesse curto espaço de tempo, para continuar crescendo.

Qual a importância dos novos reatores? Como o Brasil acompanha esta evolução?
O mundo está hoje tratando de desenvolver os reatores nucleares de quarta geração.
Certamente um dos mais promissores é o chamado "High Temperature Graphite Reactor" (HTGR) ou "Very High Temperature Graphite Reactor" (VHTGR). Esse reator tem origem em uma patente alemã de meados da década de 80. É uma concepção completamente diferente da maioria dos reatores nucleares que se conhece, principalmente aqueles de origem americana que se utilizam da água leve pressurizada como moderador. O HTGR está sendo desenvolvido, principalmente, na África do Sul, na China, na Rússia e no Japão. Trabalhos publicados no final de 2007 mostram que os Estados Unidos voltaram-se novamente para a energia nuclear e os reatores HTGR são o principal foco dos grandes laboratórios de
pesquisa, como o Oak Ridge National Laboratory (ORNL). A grande vantagem desses reatores modernos, moderados a grafite, é que eles são intrinsecamente seguros, têm alta eficiência e a utilização do material resultante do decaimento radioativo para fins bélicos é extremamente difícil com a tecnologia atual.

Como este tema é tratado no Brasil?
O Brasil, nas décadas de 70 e 80, investiu maciçamente na pesquisa da energia nuclear, principalmente na área de recursos humanos. Todo aluno de pós-graduação, de qualquer área, era incentivado a fazer cadeiras na área da engenharia nuclear e tinha um "upgrade" na sua bolsa de estudos. Em resumo, o País tinha massa crítica humana capaz de produzir, em curto espaço de tempo,tecnologia de ponta nessa área. De lá para cá, a energia nuclear foi demonizada e hoje tal pesquisa se restringe a um número bastante reduzido de instituições e ainda mais reduzido de alunos. Em termos de reatores HTGR, eu diria que não se faz praticamente nada, ou quase nada, em termos de pesquisa e muito menos em termo de desenvolvimento tecnológico no País.

Qual a relevância do uso de espuma grafítica em reatores e em outras áreas?
A espuma grafítica tem sua origem em uma patente do final da década de 80, nos Estados Unidos, no Oak Ridge National Laboratory (ORNL). Imediatamente foi verificada sua altíssima
capacidade de transmissão de calor e de energia e as aplicações nessa área começaram a surgir no dia-a- dia. Além de dissipadores de calor para equipamentos eletrônicos, esse material tem sido usado em trocadores de calor de veículos pesados, com uma redução significativa no consumo de combustível, em roupas protetoras de bombeiros, etc. Mais recentemente o ORNL iniciou a pesquisa desse material para utilização em reatores nucleares do tipo "one way", ou seja, a alta porosidade da espuma grafítica seria impregnada com urânio enriquecido a 20% e o reator funcionaria por 25 anos sem recarregamento. Esse reator seria usado nas viagens espaciais, mas com um pouco de imaginação alguém poderia até pensar em veículos terrestres que já saíssem das fábricas abastecidos por toda a sua vida útil e sem emitir gases nocivos ao meio ambiente.

Fonte:http://espacointeressenacional.blogspot.com

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